19 de outubro de 2011

Entrevista: Os países emergentes e a Nova Ordem Mundial

Desde o fim da Guerra Fria, a política internacional tem se modificado e se reinventado. A conjuntura atual aponta para a ascensão de diferentes polos de poder no mundo e os países emergentes, como o Brasil, possuem papel essencial neste novo ordenamento. Para comentar sobre o assunto, entrevistamos Lucas Amaral Leite, mestrando em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-graduação San Tiago Dantas (Unesp/Unicamp/PUC-SP). O acadêmico é ainda consultor pelo Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais e tem estudado o papel, cada dia mais preponderante, dos chamados BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China).

Para aprofundar mais sobre o assunto, confira também o site oficial do Centro de Estudos e Pesquisas – BRICs.



Observal – Não se tem um consenso entre os acadêmicos sobre o ordenamento no enquadramento político do mundo pós-Guerra Fria. Você acredita que o ambiente internacional está seguindo para uma multipolaridade? Neste caso, qual o papel dos países emergentes, em especial o Brasil?

Lucas Leite – Sim, não tenho dúvidas de que estamos seguindo para um mundo multipolar. O papel dos Estados Unidos ainda é extremamente importante e é inegável seu poder econômico e militar, mas não se trata necessariamente de uma "diminuição" de poder, mas do aumento das capacidades de outros atores. Os países emergentes, em especial os BRICS e outros, como Turquia, Indonésia e México, têm um papel preponderante nesse reordenamento do sistema internacional. São eles que atualmente mantém níveis elevados de consumo interno, além de se perceberem como os novos mercados em potencial, uma vez que tem conseguido grande estabilidade econômica ao mesmo tempo em que aumentam a participação nos atuais fóruns de negociações multilaterais. Um exemplo é a atuação sino-russa no Conselho de Segurança em relação à Síria, em que vetaram uma resolução apresentada por países europeus.

                       





Observal – Com a ascenção do Brasil como potência regional, como você enxerga nosso papel na conjuntura latino-americana? Conseguiremos ser um líder regional?


Lucas Leite – A última década presenciou uma política externa brasileira mais assertiva em relação à América do Sul. É importante definir que a diplomacia brasileira hoje trabalha mais com o conceito de atuação brasileira no sub-continente sul-americano do que necessariamente com a ideia de América Latina. Isso diz muito em relação ao foco que se dá aos países da região e às instituições que são propostas. O Brasil cedeu em relação às demandas de países como Bolívia e Paraguai, mas num contexto de cooperação em que se pretende diminuir as desigualdades entre os vizinhos e essa talvez tenha sido a "jogada" mais inteligente de nossos formuladores de política externa. Não temos problemas com nenhum de nossos vizinhos e conseguimos lidar com os problemas que aparecem com grande desenvoltura. A criação da Unasul e do Conselho de Defesa Sul-Americano são exemplos de novas instituições em que o Brasil poderá demonstrar se tem a capacidade de ser, de fato, uma potência regional. Que o país está à frente de qualquer outro da região em termos econômicos, não há dúvida alguma. No entanto, se o país quiser ocupar um lugar de destaque nessas instituições, terá que perceber que os custos poderão ser maiores que os ganhos em alguns momentos – o que é típico das potências regionais, garantidoras da ordem e da estabilidade em geral.




Observal – Como você avalia a cobertura da mídia brasileira sobre a conjuntura latino-americana?


Lucas Leite – A mídia brasileira parece mudar junto do sistema internacional. O que antigamente significava um foco enorme nas relações com os EUA e a Europa, hoje segue outro ritmo. A cobertura avançou muito para as relações com a China e os outros países dos BRICs, por exemplo. Em relação à América Latina, é inegável que a cobertura também melhorou tanto quantitativamente quanto qualitativamente. Isso é um reflexo das relações brasileiras da última década, nossa maior presença na resolução de conflitos, na criação de instituições, parcerias comerciais, expansão do crédito pelo BNDES para países da região, etc. A mídia não necessariamente deixou de dispensar atenção aos principais centros de poder, mas percebeu – da mesma forma que nossos formuladores de política externa em geral – que não é possível fechar os olhos para os países que tem problemas parecidos com os nossos, que são nossos vizinhos e que representam grande potencial de parceria em termos políticos e econômicos.

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